A homenagem aos 40 anos do axé, feita com um ensaio da influenciadora Lore Improta, vestida de Barbie com bananas na cabeça e tornozelos, reacendeu um debate urgente sobre representatividade, apropriação cultural e o apagamento da negritude.
O axé não é apenas um gênero musical: é uma expressão de resistência negra, nascida na Bahia, moldada pelos blocos afro, pelos tambores e pela espiritualidade das religiões de matriz africana. Reduzi-lo a uma estética branca e descontextualizada é um apagamento da sua verdadeira essência.
Ao longo de quatro décadas, Margareth Menezes, Ilê Aiyê, Olodum, Carlinhos Brown, Grupo Araketu e Márcia Short ajudaram a construir o axé. Mas, ao invés de celebrar esses ícones, o ensaio fotográfico optou por uma referência pop ocidental como a Barbie, ignorando a representatividade negra e reforçando um estético-branco que não traduz o verdadeiro espírito do axé.
Num Brasil onde a população negra ainda luta por visibilidade, escolher uma mulher branca como símbolo dessa celebração não é um acaso, mas um reflexo da estrutura racista que continua apagando o protagonismo negro.
A figura da Barbie, símbolo de um padrão de beleza eurocêntrico, não dialoga com as raízes do axé. Essa escolha não é apenas estética, mas também política. Ela reafirma a hegemonia branca na mídia e na cultura popular. O axé, que nasceu dos tambores dos blocos afro e das ruas de Salvador, tem sido sistematicamente embranquecido pela indústria musical, reduzido a um conceito comercial que ignora sua potência ancestral.
O uso da banana como acessório não pode ser tratado como algo ingênuo. A associação da banana com a cultura negra tem raízes racistas, remontando a séculos de desumanização de corpos negros.
Mesmo que a intenção fosse apenas remeter à cultura tropical, não há neutralidade nesse gesto. Ele carrega um histórico de opressão.
Os 40 anos do axé deveriam ser celebrados por aqueles que o criaram: os artistas negros que moldaram sua identidade e resistência. Por isso, uma homenagem legítima precisa valorizar músicos negros, utilizar elementos visuais que remetam à ancestralidade africana e garantir que os protagonistas do axé sejam reconhecidos e celebrados.
Se a intenção fosse realmente honrar o axé, o ensaio poderia ter trazido nomes como Margareth Menezes, Carlinhos Brown, Grupo Araketu e Márcia Short, artistas que não apenas cantam axé, mas vivem e carregam sua história na pele, na voz e na luta.
Essa discussão vai muito além da escolha de uma dançarina branca para um ensaio. Trata-se de uma estrutura histórica que continua apagando a presença negra da própria cultura que criou. O axé é uma herança da luta negra brasileira, e sua celebração precisa refletir essa verdade.
Por fim, é fundamental que a indústria cultural e o público repensem suas escolhas e exijam que homenagens a movimentos negros sejam feitas com respeito, coerência e representatividade real. Axé não é fantasia, não é apropriação e, definitivamente, não é Barbie.
Chegou a hora de reivindicar o protagonismo negro nas narrativas que dizem respeito à cultura afro-brasileira. O axé pertence ao povo negro e deve ser contado, representado e celebrado por aqueles que carregam essa história em sua pele e ancestralidade.
A ausência de corpos negros no centro dessas homenagens não pode mais ser normalizada. A cultura negra precisa ser contada por quem a construiu. Qualquer homenagem ao axé sem seus verdadeiros protagonistas é apenas mais uma tentativa de embranquecer uma história que pertence ao povo negro.
Fortaleça, compartilhe e amplifique as vozes negras! Nossa história é nossa! Que ela seja contada, vivida e celebrada por nós!
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