O republicano Donald Trump foi eleito o próximo presidente dos EUA sob a promessa de aumentar as tarifas de importação para parceiros comerciais, principalmente a China, nação com a qual ele já travou uma guerra comercial no primeiro mandato, entre 2017 e 2021.
Em seu plano econômico, Trump promete impor uma alíquota de 60% ou mais às importações de produtos chineses, e taxas de 10% a 20% na entrada de mercadorias de outros países.
O Brasil é um importante fornecedor de alimentos para os EUA hoje: é o maior para o café, por exemplo. Outros itens agrícolas que têm peso na exportação para os americanos são suco de laranja, carne bovina, produtos da cana-de-açúcar, couro e soja.
Então, um "tarifaço" do Trump poderia impactar o agro do Brasil? Analistas de mercado e associações entrevistadas pelo g1 destacaram dois pontos: é muito difícil que Trump taxe a importação de produtos de primeira necessidade, como o café e a carne, sob o risco de provocar um aumento nos preços dos alimentos nos EUA; além disso, o país é o que mais consome café no mundo e esse setor (cafeterias e torrefações) gera muitos empregos. Uma possível guerra comercial deve atingir mais a China e produtos de tecnologia; neste cenário, a China pode taxar produtos agrícolas dos EUA, o que teria impacto positivo para o agro, levando a um aumento das vendas de soja do Brasil para o país asiático, como aconteceu no primeiro mandato de Trump, e também de carne bovina e milho.
Para o analista da consultoria Safras & Mercado Fernando Henrique Iglesias, o republicano não vai correr o risco de enterrar a sua popularidade causando um aumento de preços de produtos de primeira necessidade nos EUA. "Hoje, por exemplo, os Estados Unidos são o segundo grande comprador de carne bovina do Brasil [depois da China]. Eles estão na pior posição do seu rebanho de bovino desde os anos 50. Então, eles não têm muito como abrir mão do Brasil neste momento", exemplifica Iglesias.
"Para qualquer governo do mundo, alta de preços dos alimentos é um assunto extremamente delicado. Por mais protecionista que Trump seja, ele não vai tomar uma medida que custe caro ao seu governo", acrescenta.
Para Iglesias, a guerra comercial do Trump deve ficar muito concentrada na China e em produtos de tecnologia, como aconteceu no primeiro mandato do republicano. "Como em carros elétricos chineses, componentes eletrônicos, e outros manufaturados que a China exporta", ressalta o analista da Safras.
A consultoria StoneX vai na mesma linha, ressaltando que os esforços protecionistas de Trump serão focados nos chineses. "Não existe, até o momento, a expectativa da imposição de tarifas sobre produtos alimentícios brasileiros", diz a StoneX, lembrando que o primeiro governo Trump não taxou produtos agrícolas do Brasil.
Foi diferente, contudo, para os produtos industrializados. Em 2019, o republicano impôs tarifas para o aço brasileiro.
Café – O Brasil é o principal fornecedor de café dos EUA, país que está entre os maiores consumidores mundiais da bebida. Cerca de 15% das exportações brasileiras deste produto vão para o país norte-americano. Por isso, não seria nem "sensato" da parte dos EUA aumentar imposto de importação, comenta o diretor-geral do Conselho dos Exportadores de Café do Brasil (Cecafé), Marcos Matos.
"Quando cito sensatez, refiro-me ao fato de não ser lógico tributar ou ampliar tributação sobre algo que os Estados Unidos não produzem e em que lideram o ranking de consumo", pontua Matos, acrescentando que a população americana gasta, por ano, US$ 110 milhões em café. Este dado faz parte de um estudo conduzido pela empresa de pesquisa norte-americana Technomic, em 2022, a pedido da National Coffee Association (NCA, principal associação de café dos EUA).
Esse mesmo estudo revela que o setor cafeeiro (torrefações, cafeterias, etc) sustenta mais de 2,2 milhões de empregos nos EUA, proporcionando US$ 100 bilhões em salários, além de representar 1,3% da economia do país, e responder por US$ 38 bilhões de receitas de impostos.
Soja – Há um outro consenso de que as exportações de soja do Brasil podem aumentar para a China, caso os EUA levem para a frente a promessa de taxar os produtos do gigante asiático. Isso já aconteceu no primeiro mandato de Trump, quando os dois países protagonizaram uma intensa guerra comercial entre 2018 e 2019. Em resposta a barreiras tarifárias impostas por Trump, a China taxou, em 2019, uma série de produtos norte-americanos, incluindo a soja, com uma alíquota de 25%, destaca um relatório da consultoria StoneX. Esse movimento fez a China ampliar as suas compras de soja brasileira na época, para compensar a redução da importação do grão americano.
Brasil e EUA são, respectivamente, os maiores exportadores mundiais da leguminosa. Além disso, os brasileiros são os maiores fornecedores do grão para o mercado chinês. A soja, assim como o milho, é muito importante para a China conseguir alimentar seus rebanhos, principalmente o de suínos, que é o maior do mundo.
Milho – As exportações de milho brasileiro também podem ser beneficiadas, pontua o analista da Safras. Assim como no mercado de soja, o Brasil e os EUA são competidores mundiais nas vendas de milho. Em 2023, o país chegou a superar os americanos como maior exportador do cereal.
Carne – Por fim, o mercado de carnes do Brasil é outro setor que pode se beneficiar de uma nova guerra comercial entre chineses e americanos. A China é um dos maiores compradores mundiais de carne. "Os EUA são um competidor direto do Brasil no mercado de carnes. O Brasil lidera nas exportações de frango, enquanto os Estados Unidos são o segundo colocado. No caso da carne suína, quem lidera são os EUA, e o Brasil vem em terceiro. Na carne bovina, o Brasil é líder global, enquanto os EUA estão um pouco abaixo [quarto lugar]", explica diz Iglesias, da consultoria Safras.
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